quinta-feira, 11 de abril de 2013

Itinerário

Chego e enterro minha presença. Vejo a vida (dos outros) acontecer ao redor. Passa um, passam dois. Um suspiro. Pensamento implausível. O asfalto, ao meu lado, abaixo, moldado à tantas atrasadas vidas  rolando em suas costas. Conversas paralelas, olhares perdidamente determinados ao oco destino. Alguns vão, outros seguem aguardando. Passam três, quatro e cinco. Todos vão. Repassa o primeiro. E o segundo. E a vida. Só fico eu, contraditoriamente enterrado na ideia mais livre que existira, e um morador de rua, já residente daquele úmido canto, acompanhado de seu saco-cheio-de-nada. Ele me olha. Mexe em sua sacola, revira seus pertences (e o que pertence?). Re-olha-me. Levanta as sobrancelhas e solta. "Moço." Suavemente desloco meus olhos ao homem. "Que mal te pergunte, que ônibus espera? Já faz horas que tá aí parado e tudo que tinha pra passar já passou. Umas três vezes" Sem mostrar os dentes nem as lágrimas, sorrio. "Eu espero qualquer um que não passe aqui." E fiquei.

2 comentários:

  1. Quantos de nós podem contar com um destino...

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  2. ''Desaparecer sem deixar rastros: tal é o privilégio do mendigo.'' Emil M. Cioran.
    Até,
    Luccas.

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